segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

dicionário vermelho de palavras bonitas









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Ela sempre foi apaixonada por palavras. Desde que elas eram apenas sons indecifráveis e desconexos. As formas das letras a encantavam. Ali, ela enxergava apenas códigos que não queriam dizer absolutamente nada. Um dia decidiu que já estava na hora de dar um passo adiante nessa relação intelectual. Comprou um caderno grande vermelho em que anotava as suas palavras favoritas. A coleção era dividida em duas categorias: palavras bonitas (e só) e palavras com significados bonitos.

Nessa época, a moça que só tinha duas sílabas no nome elaborou uma teoria simples e definitiva. Lela ignorava os sinônimos. Para ela, uma coisa só podia ser bem expressada por uma palavra. Só uma palavra era adequada para aquilo. Uma só. O resto era apenas semelhante ou alguma coisa que chegou muito perto. O problema começou quando a teoria começou a confundi-la.

E para que existem essas teorias, senão para confundir a cabeça de quem as cria?

Seguindo a lei da física quântica, aquela que faz acreditar que tudo se aplica à tudo, as coisas começaram a se misturar. E logo, sem perceber, se tornou uma pessoa literal. A moça acreditava no sentido único das palavras e das ações, e claro que isso escondia uma auto-armadilha. Ao mesmo tempo em que ignorava os sinais que a vida dá (por coincidência ou Providência) iludiu-se pouco com as pessoas. (Con)Viveu assim por muito tempo, evitando a ambigüidade com muita dedicação. Até o dia em que um diálogo improvável a despertou desse transe.

_ Você poderia fazer parar de chover.
_ E se eu não quiser?
_ E se eu pedir?
_ Não peça.

A intuição de que não estavam falando sobre o clima a fez prestar atenção na sua falha. Passou tempo demais esforçando-se em compreender o sentido lógico das palavras sem ouvir o murmúrio semântico que existia por trás delas. Que de fato, existe. E o inconsciente atento o decodifica sempre. Mesmo que guarde a informação num lugarzinho escondido com medo dos nossos boicotes.
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