Vidas Enquadradas II
por Gilberto Avelino Mendes
A cadeia é silenciosa a partir de algumas horas da noite, e este silencio é ainda mais angustiante que a algazarra e os alvoroços do dia. A cadeia dói na alma dos presos, durante o dia, mas dói muito mais durante a noite, quando os pensamentos dos internos se elevam para deuses surdos, quando seus olhos se voltam para horizontes limitados, quando seus ouvidos escutam apenas o som de suas próprias lástimas.
Estou atento em meu posto, nestes instantes. Sou um dos atalaias que vigiam, que tenta filtrar deste silêncio os sons que denunciam os maus pensamentos. Sou feito para que seus deuses continuem surdos, para que seus horizontes continuem ainda mais limitados e, se der, que as lástimas sejam atenuadas ou substituídas. As novas lágrimas parecem ser menos sofridas que as antigas.
Na cadeia, tudo é quadrado. Prédios quadrados, janelas absolutamente quadradas, vidas enquadradas, sentimentos quadrados, se é que me entendem? Num desses eqüiláteros, um homem fuma seu cigarro demoradamente, absorto no tempo, o tempo esquecido dele. Em um outro, um jovem (juventude perdida!) grita uma blasfêmia qualquer, o eco parece devolver o xingamento – Deus! Nem mesmo os ecos respeitam essa gente! Um estuprador derrama uma lágrima, depois da milionésima, na cadeia, eles são santos e castos. Em outro enquadramento, o homicida arrota sua arrogância, num reino que cultua a violência eles são reis.
Em outro quadro, alguém deles assovia uma triste canção. Parece querer que o som espante sua tristeza. A infelicidade é feita de silêncio, a alegria necessita de som para sobreviver. Aparências, nada mais que aparências, elas são necessárias na cadeia, sobre elas estão as bases desta consciência enclausurada.
Um espelho salta para fora de uma janela e busca a mim em seu reflexo. O reflexo me vê, atento, vigilante. O espelho se vai, frustrado, recolhendo-se para uma outra oportunidade.
Não será ainda desta vez, eu penso!
Não será ainda desta vez, eles pensam!
E a vida de todos nós continuará enquadrada por mais algum tempo!
A cadeia é silenciosa a partir de algumas horas da noite, e este silencio é ainda mais angustiante que a algazarra e os alvoroços do dia. A cadeia dói na alma dos presos, durante o dia, mas dói muito mais durante a noite, quando os pensamentos dos internos se elevam para deuses surdos, quando seus olhos se voltam para horizontes limitados, quando seus ouvidos escutam apenas o som de suas próprias lástimas.
Estou atento em meu posto, nestes instantes. Sou um dos atalaias que vigiam, que tenta filtrar deste silêncio os sons que denunciam os maus pensamentos. Sou feito para que seus deuses continuem surdos, para que seus horizontes continuem ainda mais limitados e, se der, que as lástimas sejam atenuadas ou substituídas. As novas lágrimas parecem ser menos sofridas que as antigas.
Na cadeia, tudo é quadrado. Prédios quadrados, janelas absolutamente quadradas, vidas enquadradas, sentimentos quadrados, se é que me entendem? Num desses eqüiláteros, um homem fuma seu cigarro demoradamente, absorto no tempo, o tempo esquecido dele. Em um outro, um jovem (juventude perdida!) grita uma blasfêmia qualquer, o eco parece devolver o xingamento – Deus! Nem mesmo os ecos respeitam essa gente! Um estuprador derrama uma lágrima, depois da milionésima, na cadeia, eles são santos e castos. Em outro enquadramento, o homicida arrota sua arrogância, num reino que cultua a violência eles são reis.
Em outro quadro, alguém deles assovia uma triste canção. Parece querer que o som espante sua tristeza. A infelicidade é feita de silêncio, a alegria necessita de som para sobreviver. Aparências, nada mais que aparências, elas são necessárias na cadeia, sobre elas estão as bases desta consciência enclausurada.
Um espelho salta para fora de uma janela e busca a mim em seu reflexo. O reflexo me vê, atento, vigilante. O espelho se vai, frustrado, recolhendo-se para uma outra oportunidade.
Não será ainda desta vez, eu penso!
Não será ainda desta vez, eles pensam!
E a vida de todos nós continuará enquadrada por mais algum tempo!
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